A presença de distúrbios psiquiátricos maternos durante o período gestacional e no pós-parto é reconhecida como um problema importante relacionado com a pediatria, sendo de alta prevalência em alguns países, com estimativas que variam entre 15 e 50% para a depressão e ansiedade. Também é reconhecido que essas alterações podem causar prejuízos importantes para a saúde das crianças, em seus mais variados aspectos.
Possíveis prejuízos
Um dos prejuízos que pode estar presente em crianças nascidas de mães que sofreram com tais problemas durante o período perinatal é a alteração no desenvolvimento neuropsicomotor dessas crianças. Alguns mecanismos têm sido levantados como hipóteses para a ocorrência desses transtornos. A presença de ansiedade e/ou depressão materna pode levar a um aumento da concentração de cortisol fetal, distúrbios no eixo hipotálamo-hipofisário-adrenal, redução do fluxo sanguíneo através da placenta e alterações no nível de serotonina nos cérebros das crianças. Além disso, podem ser causadoras de distúrbios no processo de ligação entre mãe e bebê, causando redução na capacidade de cuidado dos filhos.
A literatura especializada é repleta de estudos que tentam avaliar a associação entre esses elementos, porém com resultados muito discrepantes entre si. Sendo assim, um grupo de pesquisadores australianos realizou um trabalho de meta-análise, publicado em setembro de 2020 na JAMA Pediatrics, que tenta lançar mais luzes a respeito do tema.
Os artigos selecionados para contribuir para o estudo são aqueles que avaliaram a exposição de ansiedade e/ou depressão materna com os desfechos de desenvolvimento da prole — socioemocional, cognitivo, linguagem, motor e adaptativo — no período de vida entre 4 semanas e 18 anos de idade. Foram assim incluídos 191 estudos.
Os resultados encontrados suportam a associação negativa entre ansiedade e/ou depressão materna no período perinatal (tanto na gestação quanto no pós parto) e desenvolvimento neuropsicomotor da prole.
Mais especificamente, o estudo sugere as seguintes associações:
- Associação leve a moderada no desenvolvimento socioemocional, quando o transtorno ocorre em qualquer momento no período periparto;
- Associação leve a moderada no desenvolvimento cognitivo e de linguagem quando o transtorno ocorre antes do nascimento;
- Associação moderada a intensa no desenvolvimento cognitivo e de linguagem quando o transtorno ocorre após o nascimento;
- Associação leve a moderada no desenvolvimento motor quando o transtorno ocorre após o nascimento (principalmente no período pós-parto);
- Associação leve a moderada no comportamento adaptativo quando o transtorno ocorre antes do nascimento.
De forma bastante interessante, o estudo também consegue associar alterações no desenvolvimento socioemocional durante todo o período da infância, ou seja, os transtornos causados na prole por depressão e/ou ansiedade materna durante o período perinatal podem perdurar durante um longo período.
Esse estudo contribui com o conhecimento já difundido sobre a importância dos cuidados da saúde mental em gestantes e mães, uma vez que a presença de distúrbios psiquiátricos maternos como a ansiedade e depressão, que acomete uma em cada quatro mães, pode levar a prejuízos significativos no desenvolvimento neuropsicomotor a longo prazo das crianças nascidas dessas mães.
Autora: Dolores Henriques
Médica formada pela UNIRIO ⦁ Residência médica em pediatria pelo HUPE/UERJ ⦁ Médica concursada do Ministério da Educação (Colégio Pedro II e CEFET-RJ) ⦁ Tem experiência nas áreas de Terapia Intensiva Pediátrica, Pediatria Geral e Medicina de Urgência.
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